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Entrevista: Roosevelt Starling

O Professor Roosevelt Starling concedeu uma entrevista ao blog [“Comporte-se”], na qual fala sobre sua história, e sobre aspectos históricos e políticos da Análise do Comportamento. As respostas podem ser conferidas na íntegra, também aqui, no Psicologia e Ciência.

1 – Olá Dr. Starling. Primeiro gostaria de saber um pouco de sua história. Em breves linhas, o que te levou à Psicologia e, posteriormente, ao Behaviorismo?

Quando me interessei pela clínica psicológica – o curso de psicologia foi uma decorrência disso – já havia cursado duas graduações e encaminhava a terceira. As contingências e suas vicissitudes, parafraseemos, encaminharam meus interesses primeiro para a Física e, a seguir, para a Economia. Contudo, a densidade de reforçamento que uma e outra produziram não foi suficiente para manter minhas respostas cá e, depois, lá. Permanecia incomodado. Em retrospectiva, parece-me que o catalisador da escolha que me conduziu ao curso de psicologia foi a minha terapia pessoal, que então se encaminhava para a sua conclusão. Filho, sobrinho e primo de médicos, havia desde sempre vivido num ambiente de médicos e de hospitais e a minha história de reforçamento apontava o ofício de “curandeiro”, aqui na melhor acepção da palavra, como algo desejável.   Minha própria terapia psicológica deu-me o modelo do tipo de “curandeiro” que desejava ser e o caminho mais rápido para ele não era a medicina, mas sim a psicologia. Na época, tinha ainda menos clareza do que hoje de que “rápido” e “melhor” podem conduzir a resultados bem diferentes…

Não foi exatamente o behaviorismo que me atraiu, mas sim a Análise do Comportamento. Tanto quanto posso me dar conta, este interesse se deu principalmente por dois acontecimentos acidentais superpostos ao pano de fundo de duas histórias incidentais que, creio, haviam deixado prontos os alicerces históricos para que a exposição a um projeto naturalístico para a psicologia de pronto ganhasse a minha atenção. O primeiro deles foi a descoberta e a leitura de um livro encontrado ao bisbilhotar o acervo da biblioteca da PUC-MG, onde cursava economia. Era o “Principles of Psychology”, de Fred S. Keller (1899-1996) e William N. Schoenfeld (1915-1996). O segundo foi ter conhecido e me aproximado do Prof. Oyama A. Ramalho, dono de extenso conhecimento da obra de B. F. Skinner (1904-1990) e de uma arguta percepção das implicações dela, sobretudo para a educação, mas que, por circunstâncias históricas e contingências pessoais, é virtualmente desconhecido em nossa comunidade.

Incidentalmente, eu havia sido criado sob a influência de duas pessoas com forte repertório experimentalista e empiricista, meu avô paterno e meu pai, embora pense que ambos ficariam surpresos se isso lhes fosse dito. Finalmente, a primeira graduação que eu cursei, ainda muito jovem, foi em Física, bacharelado, um curso que não promoveu em seus estudantes uma visão naturalística do mundo – exceto no âmbito restrito dos fenômenos do seu interesse – mas que instalou um repertório rigoroso quanto à natureza das demonstrações aceitáveis como verdade científica.

Imerso numa dieta de puro mentalismo, que era a dos cursos de psicologia da época, fiquei interessado na conversa daqueles Keller e Schoenfeld e fiquei interessado na conversa do Prof. Oyama. Maravilha: pareceu-me que ali estava uma psicologia que eu podia, literalmente, pegar com as minhas próprias mãos; ali estava uma psicologia que não me exigia fé, mas sim verificação.  E, é claro, ali estava uma psicologia que se  alinhava à minha história de reforçamento. O preço que paguei junto aos professores e colegas da época por tais interesses heréticos e excêntricos é uma lição da história.

2 – Qual a sua visão sobre a psicologia no Brasil hoje e quais as perspectivas de futuro dela enquanto ciência e profissão? E a Análise do Comportamento, como se situa neste contexto?

Esta e as demais perguntas desta entrevista abordam temas polêmicos e complexos e algumas delas contêm, de fato, duas perguntas em cada formulação.  Dessa forma, não posso esperar senão produzir respostas sinópticas, que por certo falharão em expor e examinar facetas igualmente relevantes dos temas que comentarei, para não falar de uma justa apreciação do contraditório que, comumente, está presente em contingências complexas, nas quais várias respostas, até mesmo respostas contrapositivas umas em relação às outras, podem produzir reforçamento. Supondo que este texto mereça alguma atenção caberá ao leitor, como sempre, suprir essas carências com a sua própria produção verbal.

Como eu vejo, o rótulo “psicologia” é um rótulo basicamente histórico e hoje se mantém principalmente por interesses de ordem político-institucional. Formalmente, Wilhelm M. Wundt (1832 – 1920) fundou na Universidade de Leipzig, entre 1875 e 1879, uma linha de investigações à qual denominou “psicologia experimental”, a primeira do seu tipo. Diferenciava-se, assim, da filosofia, até então o domínio disciplinar em cujo bojo se desenvolvia as especulações e investigações dos fenômenos psicológicos. Ao longo dos anos, a psicologia foi se tornando progressivamente mais “cognitiva” e menos experimental e passou a abrigar sob essa mesma denominação modelos explicativos diversos quanto ao seu objeto de estudo, quanto ao método de investigação utilizado e quanto aos critérios de validação do conhecimento que produziam. Modelos explicativos que têm por objeto de estudo fenômenos diferentes, que os investigam através de métodos diferentes e que validam o conhecimento que produzem por critérios diferentes são, parece óbvio, diferentes. Mais do que diferentes, são por vezes antagônicos no que diz respeito aos supostos pré-analíticos que mantêm e direcionam a teorização, como é o caso da dicotomia dualismo-monismo. São concepções e teorizações que dificilmente conversam produtivamente entre si porque, singelamente, não tem bases comuns sobre as quais possam fazê-lo. Como falar então numa “ciência psicológica”, como falamos numa ciência química ou numa ciência biológica? Assim, parece-me que “psicologia”, como uma ciência, não existe. Pelo menos não existe no mesmo sentido em que existe uma ciência biológica ou uma ciência física.

Também penso ser difícil conceber a psicologia como uma profissão, pelo menos no sentido em que se concebe uma profissão médica, uma engenharia ou uma advocacia, pois são tantas e tão diversas as práticas consideradas psicológicas, por vezes até mesmo contrapositivas umas em relação às outras, que não se pode por certo saber o que faria um “psicólogo” numa dada situação ou função. Na área da ação psicológica clínica, seja suficiente para ilustrar a afirmação acima a legião de terapias minerais, vegetais, animais, espirituais, luminosas, cromáticas, aquosas, fluídicas, energéticas, dançantes, oculares, neurológicas, geométricas, culinárias, corporais, filosóficas, pedagógicas, hipnóticas, sexuais, mórficas, musicais, artísticas e até mesmo perfurantes e ex post-mortem, cada uma com suas visões-de-mundo, teorizações e práticas particulares (além das combinações entre elas), todas oferecidas e defendidas como práticas psicológicas igualmente confiáveis no mercado da saúde. A meu ver, este “estado da arte” não é indicativo de uma vigorosa e saudável diversidade e pluralidade, mas sim do caos comum aos momentos iniciais de qualquer empreendimento.

O ilustrado acima é somente parte do problema de se obter uma definição profissional consistente. Há coisa de dois ou três anos, recordo-me, circulou pela internet um texto no qual colegas interessados em aplicações psicológicas nas organizações se manifestavam contra a proposta da definição da psicologia como uma profissão da área da saúde, que a seu ver os excluiria. Penso que lhes assistia a razão, como igualmente assistiria aos colegas que se interessam pela psicologia jurídica, a dos esportes e assim por diante.

Não se sabendo ao certo o que faz um membro de uma dada classe profissional, existiria, ainda assim, uma profissão da qual ele fizesse parte?

Nessa compreensão, parece que o que os psicólogos têm de fato em comum e o que faz de todos eles igualmente “psicólogos” é uma regulamentação política comum e uma representação político-institucional comum, que é a autarquia que os insere no ordenamento jurídico vigente.

Contudo, este estado das coisas não me incomoda.Pelo contrário, acho-o instigante. Para melhor compreender essa minha atitude, convido o leitor a um pequeno exercício. O tempo de existência da nossa espécie, o homo sapiens, é estimado em 200.000 anos. Como é difícil apreciar tamanho lapso temporal, façamos então uma equivalência entre 200.000 anos e 1 ano, construindo uma escala temporal homóloga. O leitor é convidado, então, a imaginar que neste um ano, que agora concentra toda a existência da nossa espécie, estamos nos últimos segundos das últimas horas do último dia do mês de dezembro.  Digamos, às 23h59min59s do dia 31 de dezembro do Ano Zero. Nessa nova escala:

·         A humanidade iniciou suas primeiras tentativas de regular o comportamento social através de regras reunidas em códigos, o direito, somente há nove dias e três horas, ou seja, neste primeiro ano, o Ano Zero da humanidade, as bases formais do direito contemporâneo foram lançadas somente na madrugada do dia 24 de dezembro [3.000 AC, no Egito].

·        Começamos a estudar engenharia há oito dias e oito horas, ou seja, na manhã do dia 24 de dezembro [2550 AC, Imhotep, também no Egito].

·         A filosofia começou a ser estudada sistematicamente somente há quatro dias e 6 horas atrás, ou seja, no amanhecer do dia 27 de dezembro [600 AC – Pré-socráticos].

·           Os princípios da medicina contemporânea, há quatro dias e 19 horas, ou seja, na tarde do dia 27 de dezembro [300 AC – Hipócrates].

·         A ciência natural, segundo as regras que hoje utilizamos, somente há 15 horas, ou seja, na manhã do dia 31 de dezembro [1660 DC – Fundação da Royal Society, na Inglaterra] e aprendemos a anestesia cirúrgica somente há sete horas, ou seja, na noite do dia 31 de dezembro [1846 DC, Hospital Geral de Massachusetts, EUA].

·         A psicologia começou a ser estudada somente nas últimas seis horas do último dia do Ano Zero, ou seja, às seis horas da noite do dia 31 de dezembro [1875 DC, Wundt] e começamos a realizar os primeiros estudos sistemáticos da psicoterapia há três horas, ou seja, às nove horas da noite do dia 31 de dezembro [Década 1940-1950 DC].

·         A primeira apresentação formal da Análise do Comportamento ocorreu alguns minutos antes das nove  da noite do dia 31 de dezembro [1938 DC – Publicação do “The Behavior of Organisms”, por B. F. Skinner] e a apresentação sistemática dos seus primeiros estudos aplicados somente há duas horas, portanto, aproximadamente às dez da noite do dia 31 de dezembro do Ano Zero [1968 – 1ª edição do Journal of Applied Behavior Analysis, JABA].

O tempo decorrido desde o início e constituição formal da nossa profissão, seis horas somente (ou 135 anos), é muito pequeno, quando comparado ao já decorrido na constituição de profissões mais antigas, como o direito (nove dias e três horas, ou aproximadamente 5.000 anos), a engenharia (oito dias e oito horas, ou aproximadamente 4.500 anos) e a medicina (quatro dias e 19 horas, ou 2.310 anos.). O leitor por certo concordará que se ele iniciasse agora o estudo de um novo campo disciplinar qualquer, após oito dias e oito horas de estudo e reflexão ele teria a obrigação de saber bem mais do que sabia nas primeiras seis horas de estudo.

A história registra para o início dessas profissões, hoje já amadurecidas, problemas semelhantes aos que enfrentamos hoje na psicologia, quais sejam os de firmar nessas comunidades um consenso majoritário quanto à definição do seu objeto de estudo ou campo de ação profissional, os da seleção da sua metodologia investigativa e os dos critérios para a verdade aceitável.  Nessas profissões, hoje já não se discute mais, exceto perifericamente, estes pontos básicos; o momento histórico delas é mais de refinamento conceitual e de desenvolvimento de novas ferramentas de análise e/ou de observação dos seus fenômenos de interesse.

Dessa forma, não me incomoda que, em meros 135 anos, ainda não tenhamos conseguido para a nossa profissão a consistência e o consenso obtidos em alguns milênios para aquelas outras.

Tendo descrito como eu vejo o presente, devo confessar que não faço a menor idéia das perspectivas futuras desse conglomerado como, aliás, é claro, não faço a menor idéia do futuro de uma maneira geral. Minha linguagem para ver o mundo é a da análise do comportamento e, assim sendo, concebo as interações humano-mundo e humano-humano de um ponto de vista probabilístico nas relações imediatas e por demais complexas nas relações temporalmente dilatadas para que se possa antecipá-las. O exercício da futurologia é, no melhor, especulativo e, no pior, delirante. Por mais fascinante intelectualmente que possa ser esse exercício, outros domínios disciplinares parecem-me mais bem equipados para fazê-lo do que o da ciência natural.

Quando considero a Análise do Comportamento, tenho observações mais pontuais, mas, para alguns desses pontos, não tão diferentes.

Há dez ou mais anos publiquei no sexto volume da coletânea “Sobre Comportamento e Cognição” um pequeno artigo no qual dizia que, da maneira como nos apresentávamos no meio social mais amplo, o que fazia de um profissional um “analista do comportamento” era, essencialmente, a sua declaração dessa asserção. Noutras palavras, falava sobre o que me parecia a necessidade – ou a desejabilidade – de se dispor meios para assegurar um mínimo de coesão e consenso na práxis daqueles que se denominam analistas do comportamento, para que se pudesse manter a função discriminativa do construto.

Para aqueles que se submetem ao crivo da comunidade verbal analítico-comportamental, publicando seus trabalhos ou apresentando-os em congressos, o controle exercido pela comunidade sobre essa declaração de afiliação é mais forte. Para aqueles que não o fazem, o controle é de muito pouco a nenhum. Noutras palavras, para esse grupo, é um “analista de comportamento” quem assim se declarar.

O problema continua me parecendo relevante, pois será através dos analistas do comportamento com os quais mantiver contato que a comunidade maior avaliará e formará sua opinião dessa abordagem. Na minha área de atuação mais imediata já tomei conhecimento, através de clientes, da existência de vários “analistas do comportamento” ou “terapeutas comportamentais”, que é como o grande público nos conhece, que nunca vi nos nossos encontros, que não tem trabalho algum publicado e – assuntando daqui e dali – cujos professores desconheço, o que é quase uma impossibilidade, dado ao nosso número ainda pequeno. Fiquei sob a impressão de que essas pessoas leram em algum livro ou artigo algumas “técnicas comportamentais” e passaram a aplicá-las, tirando daí, presumo, a identidade profissional que declaram. Vi desastres e já precisei investir um bom tempo para reparar os danos.

Estejamos preparados para mais: dissemina-se no Brasil que o “método” ABA é o tratamento de eleição para os transtornos invasivos do desenvolvimento e já se vêm “especialistas” oferecendo tratamento e “cursos”, boa parte somente com o treinamento da graduação ou declarando especializações estranhas à área e atuando sem supervisão analítico-comportamental competente e experiente nessa aplicação tão delicada. Parece que esses, mais agressivos ou menos bem formados, ou as duas coisas, também aprenderam algumas “técnicas” e entreviram uma “oportunidade de mercado”, lançando-se prematuramente ao seu encalço. O problema é que esta não é uma “oportunidade de mercado”, mais sim algo muito mais precioso e conseqüente: uma oportunidade para ampliar o bem-estar de seres humanos reais ou falhar em fazê-lo, comprometendo e desgastando, no processo, a mais efetiva das oportunidades de tratamento que eles têm.

Nos seus aspectos técnicos, a ciência se parece à mágica: depois que o prestidigitador demonstra como faz para tirar o coelho da cartola, a compreensão da técnica é praticamente imediata para o iniciante ou para o leigo culto, o que não quer dizer de maneira alguma que já se possa então executar o número com competência. “Técnicas” são, numa analogia, procedimentos relativamente grosseiros de como parafusar ou desparafusar. Desconhecendo quais parafusos se deveria parafusar e quais não, e quando se deveria desparafusá-los e quando não, e em que ordem se deveria desparafusá-los e que pressão se deveria exercer na chave de fenda, por quanto tempo e por que, o palco para o desastre está montado.

O desenvolvimento da Análise do Comportamento no Brasil se deu sob circunstâncias peculiares. A partir de um núcleo original, que não passava de dezenas, praticamente o espaço de uma geração foi cumprido sem que houvesse mudanças expressivas no número de interessados nessa abordagem. Nos últimos 20 anos, em especial nos últimos 10 anos, contingências favoráveis, dentre elas o advento da ABPMC como fator de disseminação e aglutinação, mudou esse panorama, trazendo à abordagem um número expressivo de jovens estudantes e estabelecendo assim, pela primeira vez, o problema da formação. Antes muito poucos, era mais fácil para a comunidade verbal mais refinada modelar nos poucos interessados, um a um, os desempenhos que caracterizariam um falante dessa língua. Hoje, com um número de interessados na casa dos milhares, esta tarefa apresenta desafios bem maiores.

Os colegas americanos tem se preocupado com isso já há alguns anos e a solução que encontraram foi constituir o BACB (Behavior Analysis Certification Board – http://www.bacb.com/), como uma organização independente das universidades, que certifica, mediante provas e um sistema de educação continuada, o analista do comportamento. Alguns colegas e eu mesmo temos defendido uma solução semelhante, pensando inclusive que esta seria uma função adequada à nossa associação. Dado ao estado ainda incipiente da organização social da prática clínica psicológica, não se pode impedir que alguém autoproclame a afiliação que lhe parecer melhor, como não se pode impedir que alguém, sem a habilitação formal, dirija um automóvel. Mas podem-se certificar aqueles que têm sua habilitação reconhecida pela comunidade dos seus pares, através de uma instituição representativa dela. Isso não protegeria somente os interesses dos praticantes, mas, sobretudo, protegeria o público usuário, permitindo-lhe uma escolha informada.

Outra preocupação que já manifestava no artigo acima citado, diz respeito aos nossos números. Não se sabe por certo quantos somos. A se estimar pelo comparecimento aos nossos encontros nacionais e pela vendagem dos livros da área, somos em torno de 1,5 % da psicologia brasileira. Somos, portanto, a minoria da minoria (já li a estimativa que somos 4% da psicologia norte-americana, outra minoria). Sem um censo, continuaremos sem saber e, não sabendo, fica prejudicado o planejamento para as diversas atividades da área e não se pode saber a taxa de acréscimo/decréscimo do nosso número. No já citado artigo, considerava algumas hipóteses para este estado das coisas e chamava a atenção para a relevância do número de praticantes com relação à produção de reforçamento para novos interessados.

Poucos dentre nós terão a chance de desenvolver sua carreira na academia. Simplesmente, o número de vagas oferecidas é e, tudo indica, continuará sendo, inferior ao número de interessados qualificados. A maioria de nós precisará ganhar o seu pão oferecendo seus serviços no mercado.  Convido o leitor a examinar os editais presentes e passados dos concursos públicos para o provimento do cargo de psicólogo e ele verá que a bibliografia desses concursos é majoritariamente, quando não exclusivamente, mentalista, concentrando-se, ainda, na literatura psicanalítica e, mais recentemente, na literatura de embasamento político-ideológico, que parece ser a principal vertente na qual se desenvolve a psicologia social brasileira.

Cada uma das abordagens principais da psicologia é por si mesma um universo e dominar qualquer uma delas com fluência é tarefa para uma vida. Segue-se que são mínimas as chances de um analista do comportamento dominar em alguns meses, e sem convicção, uma linguagem diferente da sua, equiparando-se, em fluência, a um “falante nativo”, digamos assim, uma pessoa que há anos e anos vem se familiarizando com aquela literatura. O resultado prático disso é discriminatório e excludente, no sentido de que as bases teóricas sob as quais se assentam o concurso fazem, na verdade, uma pré-seleção dos candidatos com chances. Num dos editais de concurso que recentemente li, conhecia, mas sem familiaridade, somente um, dos 15 ou mais autores cujas obras compunham o arcabouço teórico das provas que seriam aplicadas. Avalio que as minhas chances pessoais naquele concurso teriam sido praticamente nulas, caso eu desejasse mesmo participar; estaria já excluído, antes mesmo de concorrer. Num concurso para provimento de um cargo público isto é inadmissível, pois se choca com o imperativo constitucional da igualdade de condições aos candidatos.

Não tenho muito interesse por teorias conspiratórias e, assim, não vejo uma ação deliberada por detrás desses fatos. Mais simplesmente, penso que como o mentalismo é a corrente dominante na psicologia brasileira desde sempre (como o é na psicologia ocidental, de maneira geral), são os seus praticantes que estão em posição de formular os programas dos concursos e, ao fazê-lo, o fazem com base no que sabem e no que acreditam. Seja como for, o fato é que isso instala, sim, uma situação de exclusão e, talvez, pior, um círculo vicioso: selecionados somente os daquela linguagem, eles, por sua vez, selecionarão mais do mesmo. No mundo corporativo, como agora se diz, mentalistas selecionarão mentalistas, é claro. Se, por acidente ou boa sorte, um analista do comportamento se encontrar num destes ambientes, provavelmente estará sozinho e sitiado e, nessas condições, o aporte inovador e produtivo que a Análise do Comportamento poderia trazer àquele ambiente estará limitado.

Entristece-me ver pessoas que foram apresentadas à Análise do Comportamento através do meu trabalho às voltas com discursos estranhos às suas convicções e treinamento porque precisam assegurar uma boa oportunidade de trabalho. Frustra-me saber que parte desses, passado algum tempo, estarão falando sobre o comportamento numa linguagem mentalista, porque estarão naquela comunidade verbal e é nas contingências que ela dispõe que precisarão produzir os reforços que necessitam.

Renovo aqui, portanto, o convite que já fiz anos atrás: tenhamos como meta para os próximos dez anos nos tornarmos 10% da psicologia brasileira e nós, os professores da graduação, tenhamos como meta interessarmos e mantermos interessados no estudo e prática da Análise do Comportamento pelo menos 10% dos alunos de cada disciplina da área que ministrarmos. A meta é razoável: numa turma de 20, precisaríamos de somente dois para atendê-la. Se lograrmos este objetivo e se a Análise do Comportamento tiver realmente o potencial produtivo e transformador que julgamos que tem, isso será suficiente para que possamos, enfim, participar com melhores chances do cesto das práticas psicológicas oferecidas à seleção.

Finalmente, se se deseja manter

o projeto original da Análise do Comportamento, o da construção de uma ciência e de uma tecnologia de bases naturalísticas, será sempre necessário fundar o discurso filosófico e teórico-conceitual na produção empírica. Há alguns anos pude acompanhar, numa das nossas listas virtuais, um vigoroso e criativo debate sobre a punição, no qual se ajuntavam elaborados argumentos filosóficos, conceituais, históricos e, sobretudo, ideológicos e nenhum dado empírico, nenhum número. Um bom e culto discurso, bem ao gosto da nossa cultura discursiva e estranha à experimentação, mas nenhuma ciência.

Em que pese ambas serem partes igualmente importantes para o empreendimento científico, existe uma grande diferença entre uma “boa fala sobre a ciência” e uma “boa ciência”. É a minha esperança que nos movamos sempre da primeira para a segunda, embora, se o propósito for produzir um discurso científico e não um discurso filosófico, a segunda é que pode dar consistência a primeira e deveria, portanto, precedê-la e fundamentá-la.

3 – Como o senhor vê a aplicação do que vem sendo produzido na pesquisa básica em Análise do Comportamento hoje, no Brasil? Existe um diálogo satisfatório entre os profissionais da pesquisa básica e da pesquisa aplicada?

Ciências naturais básicas tipicamente geram ciências aplicadas. Por exemplo, a medicina é uma aplicação da biologia e de outras ciências básicas afins, tais como a química, assim como a engenharia é uma aplicação da física, da química, da geologia e de outras ciências básicas afins. Estas aplicações constituem conjuntos articulados e interdependentes de processos tecnológicos desenvolvidos com base nos princípios e relações estabelecidas e validadas nas ciências básicas. O caráter mais ou menos científico que possam requerer dependerá, fundamentalmente, da consistência conceitual e metodológica que esses processos tecnológicos guardarem com a ciência ou ciências-mãe, se assim se pode chamá-las.

Na pesquisa básica, o cientista dispõe controles artificiais para reduzir o fenômeno de interesse às suas características essenciais, a fim de estudar, à luz de um ordenamento teórico, suas particularidades básicas. Assim fez Galileu Galilei (1564-1642) com o plano inclinado, para estudar o movimento e assim fez B. F. Skinner (1904-1990) com sua caixa experimental, para estudar o comportamento. Em princípio, suas conclusões estão circunscritas ao contexto especial na qual as produziu e somente no seu âmbito têm validade máxima.

Por sua vez, o cientista aplicado não pode dispor os mesmos controles e delimitações no seu ambiente de investigação e ação profissional que, tipicamente, é o da ocorrência “natural” do fenômeno, ou seja, o fenômeno em interação plena com todas as variáveis que podem de alguma forma influenciá-lo. O conhecimento que a sua investigação eventualmente produzirá precisará ser útil neste ambiente não-controlado ou então não será de fato útil.

Nem todas as ciências aplicadas beneficiam-se em igual medida da similaridade estrutural e funcional entre o arranjo que se deu ao fenômeno selecionado para a investigação no contexto da pesquisa básica e a ocorrência do mesmo fenômeno num contexto não-controlado. A medicina e a engenharia, por exemplo, beneficiam-se enormemente da relativa invariância dos seus fenômenos de interesse nos contextos básico e aplicado e/ou da natureza paramétrica da maior parte deles.  A Análise do Comportamento, por sua vez, precisa operar num universo muito menos consistente do que o do universo inanimado, de vez que grande parte dos fenômenos do seu interesse tem componentes sócio-verbais e são, no geral, de natureza não-paramétrica.

Mais criticamente na ciência do comportamento e nas aplicações dela derivadas, a questão do nível de mensuração atingido num e noutro contexto (o básico e o aplicado) é de especial importância. O que de fato se pode medir é tempo e espaço, ou seja, os registros do relógio e do metro e mais nada. Raramente essas dimensões físicas estão inequivocamente acessíveis à mensuração do investigador aplicado.

Dessa forma, os inúmeros problemas que típica e recorrentemente presidem a transposição dos achados da pesquisa básica para a aplicação e as dificuldades históricas e recorrentes de comunicação entre estes dois campos de interesse são ampliados para o estudioso do comportamento e as ligações entre o quadro conceitual mais preciso, nascido da interpretação dos dados obtidos no contexto básico, e a sua aplicação, podem ser bastante tênues. Por vezes, parece que tudo que se pode fazer é sobrepor essa grade conceitual formal ao fenômeno aplicado, inferindo, por analogia (e não por homologia) relações que podem ou não estarem presentes. Nessas condições, têm-se explicações verossímeis, mas não necessariamente verdadeiras.

Reconhecida essa problemática, uma discussão potencialmente mais produtiva a empreender pode ser a delimitação das reais possibilidades de diálogo que estes dois campos de interesse podem ter, tendo como ponto de partida o reconhecimento mútuo dos seus propósitos imediatos diferenciados, dos seus respectivos  pontos fortes e pontos fracos e das limitações inerentes aos seus contextos específicos de ação. O fato é que, tomados por si mesmos, dificilmente cada um deles poderia atender, com integridade, à função social e humana mais plena da tarefa científica: o empreendimento de construir um conhecimento confiável sobre o mundo com a finalidade de agir sobre ele, transformando-o. O primeiro, o da pesquisa básica, por correr o risco de aprisionar-se na torre de marfim da contemplação estéril dos seus próprios feitos e o segundo, o aplicado, pelo risco de produzir folclore no lugar de conhecimento, artesanato no lugar de tecnologia e verossimilhança no lugar de verdade.

Seja como for, penso que o pior rumo para o qual possa se encaminhar esse problema é o da cessação do diálogo, por mais difícil e frustrante que ele possa ser. Nesse particular e como investigador aplicado, expresso sem receio a minha convicção da primazia da pesquisa básica, pois, se é fato que raramente, se alguma vez, o fenômeno se apresentará em seu ambiente “natural” com as mesmas características e particularidades com as quais ocorre no ambiente do laboratório, também é fato que ele não desobedecerá,  na sua apresentação não-controlada, as leis básicas que regem a sua ocorrência e que foram expostas no laboratório. Assim, entendo que a pesquisa básica, por si mesma, produzirá conhecimento confiável, venha a  ser este conhecimento aplicado ou não. Por outro lado, sem se apropriar da, e sem incorporar a produção da pesquisa básica, a aplicação ficará privada daquilo que a fundamenta e lhe dá validade científica; poderá até produzir, acidentalmente, técnicas úteis, mas não uma tecnologia.

4 – Onde, em sua opinião, a Análise do Comportamento tem mostrado melhores resultados e produção científica? Ela deixa a desejar em algum campo? Se sim, a que acha que isto se deve?

A Análise do Comportamento trouxe à humanidade a extraordinária possibilidade de estudar as ações humanas com os mesmos recursos epistemológicos e metodológicos que, utilizados na química, na física e na biologia (e nas suas aplicações), transformaram o mundo em que vivemos e a maneira pela qual vivemos nele.

[E aqui, entre chaves, faço uma digressão. Transformaram o mundo e a nossa maneira de viver nele, mas não  necessariamente – ou não sempre – para melhor, pois “melhor” é um conceito moral, de aplicação política, e sobre a moral e a política a ciência natural, qua ciência natural, não tem como se pronunciar. A ciência natural desenvolve-se como um dos artefatos culturais criados pela humanidade e se mantém, certamente, pelos reforços que tem produzido. O uso que dela se faz e se fará é um problema para a moral e para a política. Neste particular, pode-se estudar a moral e a política, como comportamentos humanos que são, à luz da Análise do Comportamento. No entanto, assim como o conhecimento das particularidades da gravitação não assegura ao cientista que os domina a capacidade de levitar, provavelmente um conhecimento científico naturalístico da moral e da política, ou, mais amplamente, das ações humanas, não assegurará aos seus detentores qualquer superioridade moral e nem lhes garantirá a prática de uma política de qualidade ética superior. A vida humana é por demais rica, plástica e complexa, tudo indica, para ser contida e explicada num subrepertório verbal único. Ainda assim, a ciência natural e a tecnologia dela derivada pode ajudar, e muito, na construção de um mundo melhor. É formidável dispor de antibióticos para as infecções, vacinas para a poliomielite, manejo auto-sustentável das florestas, pontes que não caem, óculos para os dele necessitados, previsão do tempo para a agricultura e a navegação, luz elétrica e água quente encanada, telefones, internet e i-pods, anestesia cirúrgica e chocolate suíço. É igualmente formidável, convenhamos, a possibilidade de se instalar um repertório socialmente desejável através do reforçamento positivo; manejar comportamentos socialmente indesejáveis através da extinção e da oferta de equivalentes funcionais ao invés da punição; aliviar o sofrimento de uma depressão através da ativação comportamental, sentir-se no comando da própria vida desenvolvendo um repertório de autocontrole e amar dispondo, deliberadamente, contingências mútuas positivamente reforçadoras e inclusivas.]

Expondo as reais variáveis das quais a ação humana é função, a Análise do Comportamento ofereceu à humanidade a primeira possibilidade consistente de sermos, cada um de nós, sujeitos da nossa própria história, através da disposição judiciosa, por nós mesmo, das contingências que nos afetam e nos afetarão.

O modelo desenvolvido por nossos pioneiros oferece três sólidas unidades de análise – o respondente (S-R), o operante (R-Sr) e o operante discriminado (S-R-Sr), que se definem não em termos lógicos ou estruturais, mas em termos do seu relacionamento funcional e, mais importante ainda, são cada uma delas uma descrição de relações entre eventos naturais, entre partes do mundo físico.  Abriu-se, assim, a possibilidade de se atingir um alto nível de mensuração no estudo dos fenômenos psicológicos e, portanto, uma possibilidade real de uma ciência natural das ações humanas. Segue-se, dessa perspectiva, que os resultados de maior potencial produtivo são aqueles que melhor se prestam à verificação empírica e os em que deixam a desejar são aqueles para os quais ainda é difícil obter fundamentação empírica suficiente.

5 – O que acha da existência de diferentes nomes e modelos de Terapia Comportamental existentes hoje?

Não se pode, é claro, impedir ou controlar o uso da palavra “comportamental”, que é uma palavra do léxico português de livre uso por qualquer falante e as práticas verbais de uma dada comunidade, sujeitas às contingências de reforçamento que ela dispõe, não influenciam por necessidade práticas verbais de outra comunidade. O que se pode fazer é, numa comunidade verbal específica, dispor contingências estritamente definidas para o uso de alguns nomes, isto é, contingências que reduzam o número de respostas elegíveis para reforçamento. Porém, mesmo dentro de uma comunidade verbal razoavelmente delimitada, como a analítico-comportamental, por exemplo, variações nas práticas e nas descrições ocorrerão e, até que as especificidades dessas variações sejam recusadas ou se diferenciem notavelmente das práticas e declarações originais, elas provavelmente manterão, com propriedade, o nome comum.

Uma prática comum nas comunidades verbais para aumentar o controle discriminativo de um nome é adicionar mais e mais adjetivos a um substantivo que se deseja manter e que, por suas variações, perdeu, por assim dizer, sua substância. Esse recurso pode ser usado continuadamente, havendo mesmo propostas terapêuticas que adicionam quatro ou mais adjetivos ao substantivo “terapia”.

Dar nomes às coisas ou processos é um operante verbal e, como todos os operantes verbais, responde a múltiplas determinações. Por essa plasticidade, um dos mais poderosos e refinados instrumentos de controle do comportamento humano já desenvolvido pela humanidade é a manipulação do comportamento verbal, o que se vê de maneira especial na retórica e na nomeação.

Em parte, o termo “comportamental” tateia, de fato, um espectro amplo de práticas e declarações que indicam ter mesmo particularidades comuns de concepção ou de procedimentos e, nesses casos, não se poderia recusar a propriedade do uso do termo.

Em alguns casos, o qualificador “comportamental” parece ficar sob controle da concepção teórica ou de parte dela, que aceita o comportamento, por si mesmo, como objeto válido para a intervenção clínica, mas que considera também outras determinações, muitas vezes determinações conceituais ou ficcionais, operando concomitantemente. Além de alguns modelos híbridos, esse é também o caso dos modelos ditos mediacionais.

Noutros casos, fica-se sob a impressão de que o termo “comportamental” estaria sob controle de parte das práticas ou procedimentos interventivos utilizados, que foram originalmente desenvolvidos com fundamentação teórica analítico-comportamental, mas que foram apropriados por sua utilidade imediata, despidos da sua fundamentação teórica de origem ou submetidos à outra fundamentação.

Noutros ainda, estes já de elaboração mais individual e compondo aquilo que em filosofia de ciência se chama “ciência pessoal”, o termo comportamental indica ser utilizado porque, em retrospectiva, alguma teorização ou prática que já era intuitivamente utilizada naquela aplicação veio a ser, posteriormente, demonstrada ou teorizada com mais consistência pela Análise do Comportamento.

Existem também casos nos quais se fica sob a impressão de que o qualificador “comportamental” foi acrescentado a este ou aquele substantivo sob controle de variáveis bem mais prosaicas, como, por exemplo, um interesse de mercado, para diferenciar um “produto” que se pretende comercializar em troca de pecúnia ou prestígio, ou na busca de acrescentar reconhecimento social ao “produto”; uma singela vaidade pessoal, como para ser o “criador” desta ou daquela nova terapia; um uso inconseqüente ou ingênuo da palavra ou, ainda, uma definição da palavra “comportamental” diferente daquela que utilizamos.

Seja como for, há inconvenientes na multiplicação de nomes quando estes ficam sob controle total ou parcial  de variáveis estranhas aos aspectos públicos da condição estimuladora ou quando a comunidade verbal dispõe contingências vagamente definidas para o seu uso. Nesse caso, o “nome”, na função de estímulo discriminativo, perde sua precisão de orientar o responder e o resultado é ambigüidade de controle. Coloquialmente, o resultado é confusão.

Neste mar de nomes, talvez o que se possa fazer de melhor é especificar qual “comportamental” é o “comportamental” que se deseja dispor como controle. Eu, por exemplo, descobri recentemente que ainda permaneço, orgulhosamente, como um estudioso e praticante da Terapia Analítico-Comportamental de primeira geração – vejam só que antigüidade! – entendendo como tal aquela que insiste em considerar como  categorias de análise somente as relações expostas no laboratório operante, ou seja, as da contingência de três termos, e que insiste em examinar somente os processos básicos (reforçamento, discriminação e generalização) para compreender o fenômeno clínico. E que, além disso, adere ou se esforça por aderir às dimensões propostas por Donald Baer, Montrose Wolf e Todd Risley já no primeiro número do JABA. Aproximei-me das novidades, das assim chamadas “novas gerações” de terapia consideradas comportamentais (e continuo me aproximando), mas até o ponto em que me aproximei, ainda não fiquei convencido. Tenho para mim que, até a presente data, o único modelo explicativo produzido pela psicologia que pode permitir a mensuração dos fenômenos psicológicos é o oferecido pela Análise do Comportamento e, sem a possibilidade de mensuração, ainda que potencial, não se pode fazer ciência.  Sem se constituir numa prática científica, a terapia psicológica permanecerá na fase artesanal em que se encontra: bons artesãos – bons terapeutas – acumularão um portfólio no qual predominarão sucessos, mas apresentarão também alguns fracassos, e artesões menos hábeis acumularão fracassos, mas terão tido também alguns sucessos. Ambos não saberão com precisão o porquê e a comunidade de referência somente com muita dificuldade poderá ajudá-los.

A palavra “mensuração”, quando aplicada à clínica, costuma provocar arrepios. Há aqueles que singelamente recusam – por escolha teórica, por ideologia ou por posição filosófica – a comensurabilidade do fenômeno clínico em quaisquer dos seus aspectos e, assim, inevitavelmente prendem a atividade clínica psicológica no terreno do artesanato. Algumas vezes a impressão que se tem é que, para esta visão-de-mundo nas suas formas mais extremadas, o ato de medir tivesse o poder de alterar a natureza daquilo que é medido,tornando-o menos do que é ou diferente do que é. Seria como se, por exemplo, medir a quantidade de açúcar que se põe num alimento pudesse alterar por alguma forma a natureza da doçura enquanto experiência do mundo ou o tornasse o açúcar menos doce ou, ainda, tivesse o poder de transformar o açúcar em alguma outra coisa.

Evidentemente, medir um fenômeno não é esgotar as possibilidades de conhecê-lo nos números que se obtém; medir um fenômeno é uma forma de obter um tipo de conhecimento sobre ele, que permite alguns tipos de ação que não são possíveis sem medidas. Este tipo de conhecimento é parte necessária daquilo que se chama ciência e, ainda que sem números se possa fazer boa filosofia e boa arte, dificilmente se poderia fazer boa ciência. Defendo que esta condenação da prática clínica psicológica ao limbo científico das práticas filosóficas ou artesanais, se assim se pode dizer, não é necessária para que se preservem intactos aspectos mais sutis da rica interação humana cliente-terapeuta (produções e interações sócio-verbais e seus concomitantes emocionais) e do patrimônio representado pela experiência clínica do terapeuta, que constituem, sim, componentes essenciais da tarefa clínica; podem-se mantê-los e até mesmo enriquecê-los logrando, ao mesmo tempo, avançar na direção da construção de uma prática cientifica da clínica.

6 – Existe atualmente um movimento dos Analistas do Comportamento no sentido de separarem a abordagem da Psicologia? Se sim, e isto de fato acontecesse, quais poderiam ser as conseqüências para a abordagem?

Se a pergunta for reformulada assim: “Existem atualmente contingências em ação que controlem respostas dos Analistas do Comportamento no sentido de separarem a abordagem da Psicologia?” minha resposta é um definitivo sim. Há um bom tempo. Aqui, no Brasil, e no exterior.

Periodicamente, o tema ganha relevância na nossa comunidade, quase sempre na informalidade das discussões virtuais. A discussão ganha calor e, anticlimaticamente, desaparece, para logo depois voltar. Essas  contingências tem sido o suficientemente complexas para selecionar respostas antagônicas e o suficientemente poderosas para eliciar fortes respondentes nas discussões. Como analistas do comportamento, sabemos que se um tema é discutido recorrentemente, então é porque as contingências que o governam mantêm-se atuantes. Ignorá-las não as fará desaparecer.

Na prática, essa separação já se dá. Enquanto grupo, nosso contato com o establishment da psicologia, digamos assim, tem sido tipicamente formal e político-institucional. Mantemos nossos próprios encontros (Monoglotas, como devem ser, defendo) e programas de formação pós-graduada, editamos e lemos nossos próprios livros, nossa participação nos fóruns oficiais da psicologia é reduzida e as nossas pesquisas em pouco ou em nada afetam a psicologia mentalista e vice-versa.

Por outro lado, os problemas políticos e institucionais de uma separação formal não se afiguram pequenos. Haveria o problema legal de regulamentar uma nova profissão, o que precisaria ser conduzido através do Congresso Nacional. Haveria o problema da montagem e aprovação de cursos superiores específicos, programas de pós-graduação e linhas de financiamento para nossas pesquisas, para não falar no problema mercadológico de conseguir um número suficiente de interessados para manter tudo isso. Haveria também o problema da construção e disseminação da nova imagem profissional junto à população acadêmica e a população leiga. Em suma, haveria todos os problemas relacionados à construção de uma nova rede de relações políticas, institucionais, burocráticas, acadêmicas, científicas e sócio-culturais.

Permanecendo psicólogos, todos esses problemas estão já historicamente equacionados, ainda que ao preço  de nos constituirmos como uma espécie de enclave monista dentro da psicologia dualista. Algo como falar o basco sem grandes interesses em compreender o árabe, mas morar e viver num país que fala o árabe e não tem grandes interesses em compreender o basco. Essa situação, por sua vez, manterá ativas as propriedades da contingência que controlam o anseio por um caminho próprio para a Análise do Comportamento.

Assim, penso que, por todas essas diferenças e incompatibilidades, a separação formal provavelmente ocorrerá, mais cedo ou mais tarde. Em alguns estados norte-americanos, temos a informação de esta separação já existe como fato legal.

Uma saída potencialmente factível para esse impasse parece-me ser a representada pela proposta da “behaviologia” ou “behaviorologia” (espero que, um dia, alguém descubra uma palavra melhor do que essas duas), que circulou e circula em alguns grupos de analistas do comportamento norte-americanos. Em poucas  palavras, a “behaviologia” é nada mais, nada menos, do que a proposição da constituição de um novo campo disciplinar, uma nova ciência, que integraria numa só comunidade verbal o estudo do grupo de fenômenos atualmente estudados separadamente pela Análise do Comportamento, pelas Neurociências, enquanto investigação do sistema nervoso real e não do sistema nervoso conceitual, e pelos Etólogos clássicos, campos de investigação que já compartilham notáveis semelhanças quanto aos supostos pré-analíticos, quanto à metodologia investigativa e quanto aos critérios de validação do conhecimento. Nessa hipótese, a separação se daria, mas com muito, muito mais substância do que através de uma separação meramente política.

A idéia é instigante e, embora se possa antecipar um longo tempo para a consolidação de uma empreitada como essa, pode valer à pena lançar, desde já, as cabeças de ponte, que mais não seja do que para não matar no nascedouro uma idéia promissora. Esta é uma possibilidade e uma tarefa para os jovens. Vi que alguns dos meus alunos do estágio em Análise do Comportamento que oferecia na graduação, circulavam muito bem e com conforto entre estágios na Análise do Comportamento, na Neurociência e na Etologia. Falavam-me, todos eles, entusiasmados, da complementaridade que julgavam haver nessas diversas experiências. Como professor, observava informalmente o que me parecia uma evolução favorável no repertório científico desses alunos. Quem sabe algum dos jovens leitores dessa entrevista se interesse e procure colegas naquelas outras áreas com a finalidade de desenvolver projetos de pesquisa em comum, idealmente sob a orientação conjunta e dialogada dos seus professores?

7 – Poderia deixar algumas dicas ou conselhos aos terapeutas Analítico-Comportamentais iniciantes?

O que se pede aqui é que se ofereçam algumas regras. Este é, seguramente, o pedido mais difícil e delicado dessa entrevista. Aí vai a primeira: “Sempre me ofereça o julgamento de mentes equilibradas, de preferência a leis. Códigos e manuais criam comportamento padronizado. Todo comportamento padronizado tende a prosseguir sem questionamento, acumulando força inercial destrutiva.” (Frank P. Herbert, 1920-1986).

Para as que se seguem, peço ao leitor que mantenha presente a primeira e que possa discernir o momento de  desconsiderá-las, incluindo, é claro, o momento de desconsiderar a primeira.

Alexander Pope (1688 – 1744) produziu uma importante regra sobre a aquisição de conhecimento que, numa tradução livre, pode ser redigida assim: “Um pouco de conhecimento é uma coisa perigosa; beba profundamente, ou nem mesmo prove (…)” [A little learning is a dangerous thing; drink deep, or taste not (…)]. A marca distintiva da ciência natural é que ela produz efeitos reais acentuados no mundo real e é por demais perigoso “ter uma boa idéia” de como operar uma central nuclear ou saber pilotar um avião “mais ou menos”. A Análise do Comportamento obedece às regras do jogo da ciência natural nas suas investigações e conclusões. Assim, dela beba profundamente ou nem mesmo prove.

David Hume (1711-1776) escreveu:

“Se tomarmos entre as mãos um livro qualquer… perguntemos: contém ele algum raciocínio abstrato a respeito de quantidade ou número? Não. Contém ele algum raciocínio experimental a respeito da natureza e existência de fato? Não. Então, lancemo-lo ao fogo, porque não poderá conter senão sofisma e ilusão!”.

No que diz respeito à ciência, sou uma pessoa de imaginação limitada: se algo me é dito e se me pedem que acredite naquilo sem a confirmação dos meus sentidos, não consigo crer.

Finalmente, como um destilado da minha experiência, não se apaixone por uma teoria (ou uma filosofia, ou uma ideologia). Essas abstrações são péssimas amantes. Guarde suas paixões para pessoas.

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Material para Pais e Profissionais

A Equipe do site Psicologia e Ciência deu um passo adicional na direção de ajudar pais e profissionais de saúde a lidarem melhor com seus filhos.

O estudante de Psicologia Neto criou, junto com uma equipe da Faculdade de Ciências da Saúde (UNIPAM), orientados pela Profa. Ms. Viviane, uma cartilha que ajuda pais a lidar com seus filhos por meio de dicas eficientes. O link: Cartilha para Pais.

O psicólogo Ms. Robson Faggiani, por sua vez, começou a desenvolver um Tutorial Online para o ensino de Terapia ABA, voltado para profissionais e pais de crianças diagnosticadas com autismo. O link: Tutorial ABA.

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Desenvolvimento infantil: uma leitura comportamental

Dentro da Psicologia, diversos autores postularam fases ou estágios (ou estádios, como alguns autores colocam) do desenvolvimento; nas quais, cada fase destas, engloba um conjunto de comportamentos, cognições e sentimentos que o indivíduo pode apresentar. Nestes estádios ou fases, geralmente agrupados por 1) estruturas psíquicas da personalidade; 2) estruturas cognitivas ou redes de pensamento possíveis; e, por fim, 3) idade cronológica da pessoa.


A exemplo de autores que teorizam dentro do primeiro tipo de divisão dos estágios do desenvolvimento, podemos citar Freud e Erickson, com suas teorias do desenvolvimento psicossexual e psicossocial, respectivamente. No segundo modelo, o autor mais proeminente talvez seja Piaget, o qual postula sobre os estádios do desenvolvimento cognitivo. Quanto à divisão por idade cronológica, podem ser citados Hurlock e Gesell, os quais se referem ao comportamento dos três anos, comportamento dos quatro anos, e assim por diante.

Bijou e Baer (1980) levantam certas críticas a estes modelos de teoria do desenvolvimento e apresentam a proposta de Kantor, autor interbehaviorista, que explica o desenvolvimento não com base em estruturas da personalidade ou cognitivas, mas no tipo de interação que o indivíduo é capaz de estabelecer com o ambiente. Os autores explicam que embora estas divisões pela idade cronológica ou teorias da personalidade sejam bastantes práticas e objetivas, elas são muito arbitrárias para alguém que deseje realizar um estudo mais detalhado das relações entre períodos sucessivos. Advertem também que interações significativas não ocorrem de maneira sincronizada o bastante para que se fale de comportamentos esperados por cada fase da vida, e que, mais do que esta fase, são as relações que a criança estabelece com seu meio que favorecem ou não o aparecimento de certos tipos de comportamento.

Conforme explicam os autores, ao eliminarmos as teorias que dividem o desenvolvimento pela idade cronológica ou teorias da personalidade, nos resta dividir e delimitar o fim de cada estágio de acordo com dois outros tipos de critérios. O primeiro baseia-se em fatos observáveis, manifestações comportamentais, eventos sociais e maturação biológica. O segundo, por sua vez, divide o desenvolvimento de acordo com o tipo de interação que o indivíduo é capaz de estabelecer com o meio que o cerca. É esta segunda perspectiva a adotada por Kantor.

Bijou e Baer (p. 30) apresentam os três estágios propostos por Kantor. São eles:

1-    Fundamental: “aquele no qual o indivíduo comporta-se como um sistema unificado – um organismo –, mas é bastante limitado pelas suas características orgânicas”. As interações que o indivíduo estabelece nesta fase são basicamente reflexas, e são de certo modo comuns a todos da espécie. Além dos reflexos, são também apresentados movimentos aleatórios, descoordenados, aparentemente desligados ainda de estimulação ambiental e, basicamente, sob controle orgânico. Quando confrontados com o meio, estes movimentos serão modelados de modo a tornarem-se coordenados e adquirirem funções no ambiente. Deste modo, a criança passa a ser capaz de estabelecer outros tipos de interações ao longo do tempo, passando ao próximo estágio.

2-    Básico: A movimentação aleatória e reflexa inicial vai dando lugar a movimentos coordenados, sistemáticos, os quais agem sobre o ambiente com certa finalidade. Torna-se mais independente de seus cuidadores, sendo capaz de executar tarefas cada vez mais complexas. “É nesse momento em que a criança passa por experiências que não são comuns a todas as crianças (…), e as habilidades e conhecimentos adquiridos na fase anterior – e nesta também – tornam-se mais elaboradas”, à medida que a criança vai experienciando e explorando o mundo.

3-    Societário: é neste estágio em que a criança começa a se socializar e explorar as regras sociais, instrução formal, elementos culturais e simbólicos cada vez mais complexos. Novamente, esta habilidade vai se desenvolvendo e tornando-se cada vez mais refinada à medida que a criança vai experienciando o mundo.
Bijou e Baer (p. 31) ainda lembram que, em geral, podemos dizer que o primeiro estágio tem início no pré-natal e vai até a idade em que comumente se chama de fim da infância. O segundo estágio, por sua vez, começa neste ponto e vai até a idade escolar ou pré-escolar. Já o terceiro, no qual a criança torna-se um ser social, começa neste ponto e vai até a idade adulta.

Como é possível observar, a divisão em estágios do desenvolvimento se dá, em uma perspectiva comportamental, de acordo com o caráter predominante das interações que o indivíduo estabelece naquele período. Estes marcos são, nas palavras de Bijou e Baer (p.31), simples acidentes sociológicos, e não essências do desenvolvimento. É bastante comum que se observem características de múltiplos estágios em uma criança só, pois um esvai-se no outro à medida que a criança é estimulada.

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O uso da Punição como agente educador

Punição

 

Geralmente a tarefa de ser pai ou mãe é realmente muito ardua e trabalhosa, mas sempre muito recompensadora.

Os pais tendem a ficar muito angustiados com comportamentos que seus filhos apresentam, especialmente quando  esses comportamento produzem algum tipo de problema. Esta conduta comumente é chamada pelo senso comum de disfuncional; e os comportamentos causadores do problema, de inadequados – pois são diferentes dos quais os parentes da criança julgam corretos. Os pais, por não conseguirem lidar com o problema, acabam agindo de forma bem intencionada; mas que não vai ter o efeito desejado; e pior, trazem mais consequências desagradaveis para o lar.

Talvez o questionamento mais frequente que os pais fazem aos Psicólogos e Educadores seja sobre o ato de punir. Até que ponto uma palmada ou bronca fazem efeito quando aplicada em uma criança tida como desobediente (por exemplo).

Bem, por definição, o ato de punir significa uma ação no ambiente que tem como propriedade a interrupção imediata do comportamento inadequado, como gritar em um lugar público por exemplo. Muitas vezes, para acabar com uma birra ou comportamento inadequado de qualquer ordem, os pais recorrem a punição como única alternativa. Existem, porém, várias outras formas de educar sem que se faça uso da punição.

Existem dois tipos de processo punitivo. O primeiro é a punição positiva; que,  diferentemente do que o nome parece sugerir, ela não tem nada de legal. A punição positiva é assim descrita, por que adiciona um estimulo aversivo no ambiente que interrompe imediatamente o comportamento inadequado da criança ou seja, é uma ação do pai/mãe/responsável que faz com que a criança pare de se comportar inadequadamente na mesmo hora. Como exemplo, podemos falar que se uma criança está se quebrando alguma coisa e o pai vem e da um beliscão nela, a probabilidade dela parar de quebrar as coisas vai ser grande.

 O grande problema, é que existem efeitos colaterais muitas vezes intensos; e que por isso, nem sempre justifica-se o uso da punição positiva. Um dos principais efeitos colaterais é que o comportamento  causador do problema  vai continuar acontecendo quando o agente punidor (mãe, pai ou responsavel) não estiver presente; ou seja , não existe modificação eficiente do comportamento problema, mas um deslocamento para uma situação onde o agente punidor não está presente.  Podemos dizer, além disso, que a punição positiva apenas mostra a criança o que ela não deve fazer, mas não ensina o que ela deve fazer. Por sí só, esse efeito já desqualifica o uso da punição positiva para educar.

O bater pode levar a consequências mais perigosas, pois dependendo da estrutura psicológica dos pais, pode levar a um quadro de abuso fisico ou psicológico que se transforma em espancamentos e intenso medo na criança; podendo gerar stress pós traumatico e outros problemas como timidez e problemas nos relacionamentos afetivos e sociais. 

Por outro lado existe outro tipo de punição de comportamentos inadequados, os analistas do comportamento chamam de “Punição Negativa”.

Nesse tipo de comportamento punitivo, podemos dizer que existe uma retirada de um estimulo reforçador como punição a um comportamento inadequado. Como exemplo, podemos usar a situação onde uma mãe retira o video game do filho que tirou notas baixas na escola ou então da retirada da sobremesa da filha que desobedeceu. É importante dizer que a punição negativa não necessariamente implica em retirada de um reforçador contingente a resposta inadequada, mas a qualquer reforçador para a criança.

A punição negativa parece ser uma forma de lidar com comportamentos problemas mais eficaz  que a punição positiva e menos aversiva para o processo de educação. É importante ressaltar que a criança deve estar sendo comunicada com clareza sobre os motivos que levaram a retirada de um estimulo importante para ela.

Os pais devem colocar limites; regras claras e especificas. E quando essas regras são quebradas, devem aplicar as penalidades já acordadas com os filhos, ajudando-os a fazerem a ligação entre o descumprimento da regra e a conseqüência disso. Eles precisam saber o motivo da punição aplicada.

Em termos gerais podemos exemplificar com o seguinte esquema abaixo :

esquema

Existem métodos mais eficientes na educação como o reforço diferencial de outras (comportamentos) respostas (DRO) ou o reforço diferencial de (comportamentos) respostas alternativas (DRA). Essas duas formas além de extinguir os comportamentos “inadequados” das crianças sem recorrer a punição, ainda ensinam o comportamento esperado como alternativa ao comportamento (a ser eliminado) inadequado, que na aplicação do reforçamento diferencial, não vão ser consequênciadas, entrando em extinção e sendo substituidas por comportamentos adaptativos.

Em um proximo texto iremos explorar melhor os conceitos e aplicações do reforçamento diferencial de outras respostas (DRO) e o reforçamento diferencial de comportamentos alternativos (DRA) no processo de educação.

 

 

* Nota – O termo inadequado usado nesse texto é uma referencia a comportamentos não esperados dentro de regras culturalmente aceitas no Brasil. Obviamente, dizer o que é inadequado e o que é adequado merece um maior debate, pois, mesmo os educadores tem discordâncias sobre esse tema. O Uso do termo inadequado, apenas ilustra um comportamento da criança que está causando algum tipo de problema, seja para ela mesma ou seja para o convivio social de onde essa familia está inserida, independente de valores morais sobre o que é certo e errado.

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Dependência Tecnológica em crianças

computador

Com que freqüência você negligencia tarefas para passar mais tempo on line ou jogando? Qual é a quantidade de tempo que passa em frente a telinha? Suas notas ou tarefas escolares sofrem por causa desse tempo? Com que frequencia você se sente deprimido, mal humorado ou nervoso quando está offline e esse sentimento vai embora assim que você volta a estar online?

Essas são questões que fazem parte de um teste formulado pelo Centro de Recuperação para Dependência de Internet, nos Estados Unidos.

No mundo em que vivemos, os celulares estão cada vez mais avançados, computadores e videogames de última geração e diversas outras coisas. Quase tudo que nos rodeia, está cada vez mais desenvolvido. Isto, aliado ao aumento de acessibilidade das pessoas a esta modernidade, confirma cada vez mais que as pessoas estão, de uma forma ou de outra, intimamente ligadas a tecnologia.

Não seria diferente com as crianças e adolescentes, que a cada conversa com colegas na escola, trocam informações de aparelhos mais avançados, videogames mais reais, jogos alucinantes, novos sites e blogs com informações sobre password, formas de jogar, como conquistar determinada arma ou alcançar algum objetivo. No dia seguinte, na escola, a troca continua, mas cada vez mais avançada, com outras fases, pois a tecnologia é muito atraente, extremamente rápida e o assunto de ontem, já é passado.

Os sofás e cadeiras das casas estão cada vez mais confortáveis e aconchegantes para que as pessoas fiquem cada vez mais tempo sentadas, e obcecadas pela telinha. A cada momento, a liberação de dopamina no sangue ocorre e faz com que aquela criança queira ficar mais horas ao computador ou game.

A cada dia se confirma mais e mais uma das grandes queixas que ocorrem nesses últimos tempos nos consultórios, a psicopatologia contemporânea denominada DEPENDENCIA TECNOLOGICA OU COMPUTADOR E JOGOS DE VIDEOGAME.

Este vício cresce assustadoramente, atingindo cada vez mais crianças e adolescentes.

As crianças não controlam sua vontade, sendo impulsionadas a procurar a saciedade em suas casas ou lan houses. Abdicam de comprar lanches nas cantinas da escola para gastar em horas nas lan houses. As saídas com os pais vão diminuindo a cada fim de semana, até chegar o momento em que os sábados e domingos ficam entediantes e eles querem o quanto antes que chegue a segunda-feira para ficar mais tempo em frente ao computador. As atividades sociais como ir à casa de amigos, festas, cinema ou algum outro programa diminuem drasticamente.  Elas chegam a ficar horas no computador ou vídeo game, privando assim o sono e o descanso físico.

Usam mil justificativas para escapar de problemas da vida real. A criança vai se isolando, e deixando de lado qualquer atividade, relacionamentos etc. Se, em algum momento perceberem que podem ficar distantes da possibilidade de acessar o computador ou videogame, a irritação o envolve e o desconforto emocional aumenta.

O tempo passa e vai ficando cada vez mais difícil controlar o impulso e elas acabam perdendo o controle de sua vida, progressivamente.

As pessoas que estão ao seu redor demoram para perceber que estas crianças estão dependentes da tela. Vários aspectos podem reforçar o início desta patologia, como os psicológicos (baixa auto-estima, depressão, fobias sociais, dentre tantos outros) e sociais (solidão, isolamento e o estilo de vida nos grandes centros urbanos).

Como ocorre com um viciado em álcool ou em drogas, as crianças e os adolescentes também sofrem a abstinência de estar longe do jogo e o desempenho nas tarefas corriqueiras diminui drasticamente.

Nas principais cidades brasileiras existem pessoas especializadas no tratamento desta dependência; o que pode ser feito , com sessões de psicoterapia, a qual visa devolver a perspectiva do controle e da auto-regulação do uso do computador, além de orientar e esclarecer os pais com vista à sua contribuição no tratamento. Contamos também com a ajuda de psiquiatras para, caso necessário, auxiliar com algum tratamento medicamentoso leve.

É necessário que as pessoas voltem a atenção para este assunto; pois,  no mundo que estamos, cada vez mais interativo tecnologicamente, precisamos controlar esses momentos das crianças e adolescentes para uma vida mais saudável.

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Boas vindas a nova integrante do Psicologia e Ciência

A equipe Psicologia e Ciência dá as boas vindas a nova integrante: Simone Siqueira.Ela é graduada em Psicologia pelo Centro Universitario FMU/SP. Formada em Psicoterapia Analítico Comportamental pela Academia de Estudos sobre o Comportamento Humano AECH.

Pós Graduada em Terapia Analítico-Comportamental Infantil pelo Núcleo Paradigma de Analise do Comportamento.

Possui curso de Extensão em Técnicas da Análise do Comportamento Aplicadas à Clinica e Formação Continuada em Educação Infantil. Atua como terapeuta infantil e de adolescentes, ministra orientação para pais e é Co-organizadora da Arteterapia para Criança.

A equipe Psicologia e Ciência fica mais completa a partir de agora, pois a Psicóloga Simone é especialista em Terapia Comportamental Infantil e vai trazer uma experiência de 10 anos no atendimento a crianças, adolescentes e pais para somar cada vez mais a qualidade e excelência dos textos e serviços oferecidos pelo grupo Psicologia e Ciência.

Seja bem vinda Simone.

EQUIPE PSICOLOGIA E CIÊNCIA.

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Equipe Psicologia e Ciência no SIPAT

O Psicólogo Marcelo C. Souza membro da equipe Psicologia e Ciência, apresentou na ultima terça feira, dia 04 de maio de 2010, um trabalho sobre “Prevenção e doenças do trabalho” no SIPAT ( Semana Internacional de Prevenção de Acidentes e doenças do Trabalho ) no auditório da Brasoftware em São Paulo / SP.

A Equipe Psicologia e Ciência fica muito satisfeita com mais um trabalho desenvolvido com muita qualidade sendo reconhecido e apresentado ao publico do evento.

Os Slides usados na apresentação estão disponiveis em http://rapidshare.com/files/386281061/palestra.ppt

Segue algumas fotos da apresentação do trabalho :

SIPAT

 

SIPAT1

 

 

 

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ENTENDA AS MUDANÇAS NO CÓDIGO DE ÉTICA DA MEDICINA

Esequias Caetano de Almeida Neto

A função do código de ética não é normatizar a natureza técnica do trabalho dos profissionais de uma determinada classe; mas, por outro lado, assegurar um padrão de conduta que fortaleça o reconhecimento social daquela categoria; expressando assim, normas que determinam a direção das relações entre os profissionais que a compõe e destes com a sociedade. Um código de ética deve, portanto, ser pautado no respeito à pessoa humana e em seus direitos fundamentais (1); estando, deste modo, de acordo com a declaração universal dos direitos humanos.

Partindo do princípio acima apresentado, o Conselho Federal de Medicina (CFM) colocou em vigor neste dia 13 de abril de 2010 o Novo Código de Ética da Medicina, o qual, de acordo com o presidente do órgão, tem por objetivo melhorar a relação da classe médica com a população em geral (2). Muitas das mudanças já eram previstas em lei; mas, com a alteração no próprio código, o CFM passar a ter subsídios para que se abram processos éticos dentro do próprio órgão regulamentador da profissão. A penalidade para o profissional que descumprir o que está estabelecido pode chegar, inclusive, à perda do direito de exercer a profissão; se denunciado. Ao final deste artigo, orientarei sobre como agir caso você presencie o descumprimento de alguma das regras do código de ética por parte de um médico ou instituição de saúde.

Dentre as mudanças realizadas, está a proibição de consórcios ou cartões de desconto para procedimentos médicos. Com isto, ficam proibidos aqueles planos de longo prazo para pagamento de cirurgias plásticas, tão comuns hoje em dia (3). Proíbe-se também que os médicos permitam aos pais a escolha do sexo dos bebês em processos de inseminação artificial – aliás, a partir de agora, toda e qualquer manipulação genética é proibida aos médicos, exceto na Terapia Gênica ¹.

Se o objetivo da mudança é melhorar a relação da classe médica com a população, sendo o paciente o grande contemplado pelas mudanças (2), conforme afirma o presidente do CFM, vale compreender um pouco melhor os artigos do código. Neste texto, comentarei as partes mais relevantes para a população usuária do serviço público de saúde, o SUS – não me atendo somente ao que há de novo nele.

Acima já comentei algumas das mudanças realizadas no código de ética da Medicina. Falarei agora de outros artigos relevantes ao usuário da saúde, discutindo o que mudou neles:

É vedado ao médico:

Art. 1º. Causar dano ao paciente, por ação ou omissão, caracterizável como imperícia, imprudência ou negligência

Esta regra já existia no código de ética antigo, mas é bom comentar. O médico não pode, por exemplo, deixar de atender qualquer pessoa, dentro de um hospital, que necessite de cuidados emergenciais (acidentado, infartado, ou que tenha sofrido Acidente Vascular Cerebral – conhecido como derrame, por exemplo), independente de sua especialidade, caso não haja outro médico especialista em exercício no momento.

Art. 8º Afastar-se de suas atividades profissionais, mesmo temporariamente, sem deixar outro médico encarregado de seus pacientes internados ou em estado grave.

Art. 9º Deixar de comparecer a plantão em horário preestabelecido ou abandoná-lo sem a presença de substituto, salvo por justo impedimento.

Um das grandes queixas, principalmente dos usuários do SUS – inclusive estão entre os fatores que motivaram as mudanças no código de ética (3), é a falta de médicos nos plantões. As filas, já enormes, se agravam ainda mais por causa da impontualidade médica.

O código de ética antigo já estabelecia que o médico não pode deixar seu plantão e nem pacientes sob seus cuidados sem assistência. A diferença, agora, é que caso o médico não esteja presente, a instituição na qual ele atende será responsável por substituí-lo. Caso não o faça, o diretor técnico do hospital é quem deverá ser denunciado ao CRM. No caso dos hospitais e postos de saúde da rede pública, caso não seja feita a substituição imediata do médico, quem deverá ser denunciado é o secretário de saúde da cidade. O que não pode, é ficar sem médico.

Art. 11. Receitar, atestar ou emitir laudos de forma secreta ou ilegível, sem a devida identificação de seu número de registro no Conselho Regional de Medicina da sua jurisdição, bem como assinar em branco folhas de receituários, atestados, laudos ou quaisquer outros documentos médicos.

Em tese, o código de ética antigo já proibia o médico de emitir receitas ou laudos de forma ilegível. Existem inúmeros casos de pacientes que tomaram remédio errado porque o farmacêutico não conseguiu compreender o que estava escrito na letra.

O que mudou é que, a partir de agora, o médico é obrigado a informar o número de seu registro profissional no documento que emitir (número de seu CRM). Isto facilita a identificação do médico, em caso de denúncia.

Art. 25. Deixar de denunciar prática de tortura ou de procedimentos degradantes, desumanos ou cruéis, praticá-las, bem como ser conivente com quem as realize ou fornecer meios, instrumentos, substâncias ou conhecimentos que as facilitem.

No código de ética antigo já era previsto que deveria denunciar, caso presenciasse, sinais de tortura ou procedimentos degradantes em seus pacientes. Isto vale, inclusive, se estes sinais forem oriundos de condutas dos familiares do paciente. Por exemplo, se o médico perceber que o marido espanca a esposa, ele tem a obrigação de denunciá-lo. Isto não é opcional. O médico é obrigado a denunciar.

Art. 34. Deixar de informar ao paciente o diagnóstico, o prognóstico, os riscos e os objetivos do tratamento, salvo quando a comunicação direta possa provocar-lhe dano, devendo, nesse caso, fazer a comunicação a seu representante legal.

O código de ética antigo também estabelecia que o médico não pode esconder o diagnóstico, prognóstico ², riscos e objetivos do tratamento a que submete seu paciente. O problema é que, muitas vezes, quando vai explicar ao paciente, ele usa um amontoado de termos técnicos que quem não estudou medicina não compreende. É direito do paciente exigir uma explicação compreensível.  E é dever do médico fornecê-la. Pena é que poucos pacientes exigem.

Além disso, o código de ética médica estabelece também que o médico tem a obrigação de informar seu paciente sobre as condições de trabalho que ponham em risco sua saúde (Art. 12), bem como sobre os determinantes sociais, ambientais ou profissionais de sua doença (Art. 13). Tudo isto, de maneira compreensível. Caso o médico não fale, é direito do paciente perguntar. Caso o paciente se interesse por ler seu prontuário, o médico é obrigado a explicá-lo, do mesmo modo, de maneira compreensível (Art. 88).

² – prognóstico refere-se à previsão de evolução ou desfecho de uma doença ou caso clínico.

Art. 41. Abreviar a vida do paciente, ainda que a pedido deste ou de seu representante legal.

Esta regra também já existia. Contudo, no novo código, fica estabelecido que o médico deve evitar que pacientes terminais passem por tratamentos longos e desnecessários; ou seja, nos casos em que não há como salvar a vida do paciente, é sugerido que o mesmo seja levado para casa, onde serão ministrados medicamentos para aliviar a dor e para que o paciente passe seus derradeiros momentos ao lado da família, com o menor sofrimento possível. Tudo isto, claro, com o consentimento da família (3).
Além dos artigos comentados, ainda vale lembrar que o médico tem o dever de tratar seu paciente com civilidade e consideração, respeitando sua dignidade (Art. 23); e, além disso, ter seu consentimento ou de seu representante legal para a realização de qualquer tipo de procedimento, salvo em caso de risco iminente de morte (Art. 22).

O médico não pode também revelar o que foi conversado com paciente menor de idade, inclusive a seus pais ou representantes legais, desde que o paciente tenha capacidade de discernimento, salvo quando a não revelação possa acarretar dano ao mesmo (Art. 74).

COMO PROCEDER DIANTE DA FALHA ÉTICA DE UM MÉDICO?

Conforme explica o próprio código de ética, são os Conselhos Regionais de Medicina (CRM’s) os responsáveis pela aplicação das sansões éticas aos profissionais que desrespeitem o código. Deste modo, a conduta correta a se adotar caso diante de uma falha ética cometido pelo profissional médico, é entrar em contato com o Conselho de sua região. Veja bem, o contato é com o CRM, e não com a secretaria de saúde.

No site do Conselho Federal de Medicina existe, ao lado esquerdo da tela, um menu  com o título “Serviços à População”. Clicando nele, aparecerão outros sub-menús, dentre os quais, encontra-se o formulário para denúncia do profissional médico, todas as orientações sobre informações necessárias e a conduta a se adotar em caso de denúncia de algum profissional.

Denunciemos os profissionais anti-éticos. Só assim poderemos melhorar a qualidade do nosso serviço de saúde. É burocrático o processo, mas é nossa obrigação contribuir para que sejamos bem atendidos. Ao denunciar um médico anti-ético, estará prestando um bem não só para você e sua família, mas para toda a sociedade. Não seja cúmplice das faltas éticas.

Referências:

(1)    Código de ética do Psicólogo: http://www.psicologo.inf.br/codigo_de_etica_psicologo.asp
(2)    Site Portal Médico – CRM – Revisão do Código de Ética Médica: http://www.portalmedico.org.br/modificacaocem/include/noticias/mostranoticia.asp?noticiaID=14394
(3)    Jornal A Crítica – Campo Grande: http://www.acritica.net/index.php?conteudo=Noticias&id=11688
(4)    Terapia Gênica: http://www.cib.org.br/apresentacao/terapia_genica_alexandra_zilli_word.pdf
(5)    Site Portal Médico – CRM – Novo código de ética da medicina: http://www.portalmedico.org.br/resolucoes/CFM/2009/1931_2009.htm
(6)    Site Portal Médico – CRM – Código de ética antigo: http://www.portalmedico.org.br/novoportal/index5.asp
(7)    Dicionário Michaelis: http://michaelis.uol.com.br/moderno/portugues/index.php?lingua=portugues-portugues&palavra=progn%F3stico

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O que é Psicoterapia Analítica Funcional?

Neste post, transcrevo uma parte do primeiro capítulo do livro sobre PAF publicado em 2009, traduzido por mim. Gostaria de lembrar que a lei brasileira esclarece que a pubicação em mídia de partes de artigos informativos não consitutui ofença aos direitos autorais desde que mencionadas as fontes da publicação e o nome do autor.

PAFPor começar a ler este livro, imaginamos que você esteja intelectualmente curioso e ansioso para ampliar suas habilidades terapêuticas. Você já deve ter experiência em utilizar Psicoterapia Analítica Funcional (PAF) e agora busca por um aprofundamento, ou este pode ser apenas o seu primeiro contato. Se você não tem certeza do que a PAF se trata, deve estar esperando por uma definição comportamental precisa, ou deve estar procurando por uma resposta que fale com você de forma mais intuitiva. Este livro foi concebido de forma consistente com a abordagem comportamental, porém acreditamos que não exista uma intervenção terapêutica ou uma teoria básica que seja absoluta, contextualmente independente ou “melhor” por definição. Aliás, o “melhor” sempre depende do que alguém quer alcançar. A PAF é uma terapia idiossincrática que é vivenciada de forma diferente entre aqueles que têm aprendido, praticado, recebido, pesquisado, ensinado e/ou escrito sobre ela. Então, começaremos com um banquete destas experiências. Esperamos que alguma delas faça mover o seu interior.

1) Uma cliente

Uma cliente vinha lutando contra os sintomas de Transtorno de Estresse Pós Traumático em seguidas experiências negativas com profissionais de saúde renomados. Consistentemente com a literatura sobre TEPT, ela possuía uma vulnerabilidade anterior que explicava a intensidade incomum e a severidade dos seus sintomas. Sua história incluía abandono na infância, falta de cuidado pelas pessoas em quem confiava e a morte de familiares próximos. Segue uma transcrição retirada de um e-mail no qual ela descreve as reações à sessão de terapia com RJK realizada poucos dias antes.

Você sempre pede por associações livres e esta manhã eu acordei às 6:30 farta disso. Então, aqui vai. Por que, eu fico me perguntando, você [RJK] insiste tanto neste caminho ‘perverso’, onde primeiro me encoraja a me apegar a você (ostensivamente), ao mesmo tempo que fica falando sobre o encerramento de nossa terapia e, suponho, sobre outros encerramentos também? Em que tipo de trégua impensável, eu ainda fico imaginando, Freud e os Behavioristas se sentariam na mesma mesa para tomar chá? Bem, me ocorreu que você esteja utilizando apego terapêutico/transferência na terapia de dessensibilização/exposição. Você está me pedindo para permanecer, uma e outra vez, sobre a ponte da minha zona de conforto, onde uma pessoa está “conscientemente” apegada, confiando em você, sendo eu mesma de verdade, amortecendo nosso encerramento, a cada vez que me deleito com nossas sessões.  ‘Terapia de Exposição Transferencial’, hein?

2) Um estudante de graduação

A PAF me impele a me esticar e crescer, a ser teoricamente consistente e consistente com valores em todos os aspectos da minha vida. A PAF me desafia a ver a terapia pelos olhos do cliente, a me comprometer com a auto-introspecção e a analisar cuidadosamente a mim mesmo e as minhas interações.

3) Um terapeuta cognitivo-comportamental

Aprender sobre como ‘estar’ em uma relação terapêutica tem sido um das mais valiosas idéias que a PAF tem me dado para ‘levar pra casa’. Agora eu acho que a maior parte do tempo que trabalho com um cliente, estou consciente do meu ‘ser’ e me concentro com a finalidade de estar plenamente presente – o que tem se mostrado um processo poderoso, mesmo quando desconfortável. Tenho sido impactado de forma profunda, tanto profissionalmente como pessoalmente. Estou muito mais alerta aos meus padrões de esquiva. Tenho me aproximado do desejo de conectar o meu eu pessoal ao eu profissional de forma mais real, mais humana e mais presente. Aprender PAF tem sido uma força curativa e crescente na minha vida e a tem enriquecido imensamente. Esta experiência está sendo renovadora.

4) Um terapeuta comportamental-dialético

PAF se trata de viver plenamente enquanto se experimenta emoções, aceitando tantos riscos quanto nossos pacientes, ansiando por transformar o mundo, buscando alívio para o sofrimento enquanto seguimos em direção ao amor e à capacidade de amar. Eu realmente gosto desta combinação de criatividade, expansão de fronteiras, intensidade, encontros existenciais e uma técnica terapêutica poderosa.

5) Co-autor do livro

A PAF é uma psicoterapia interpessoalmente orientada destinada a aliviar os problemas do cliente que trata fundamentalmente de relações humanas. O sofrimento humano pode acontecer na presença ou na ausência de pessoas. Ainda que a dor emocional sentida pelos clientes venha da falta de conexões significativas. O que faz a PAF única é o uso de princípios comportamentais básicos, como modelagem contingente e o uso do reforçamento na sessão de terapia. O coração da PAF é a hipótese de que o mecanismo de mudança na clínica se dá pelo responder contingente do terapeuta ao problema do cliente, ao vivo, na sessão, enquanto ele ocorre.

6) Co-autor do livro

A PAF utiliza princípios comportamentais para criar um espaço sagrado repleto de consciência, coragem e amor, onde a relação terapêutica é o veiculo primário para a cura e a transformação do cliente. A PAF modela a eficácia interpessoal nutrindo as habilidades do cliente de falar e agir de modo sensível às suas verdades e dons, de dedicar-se à intimidade e de dar e receber amor em plenitude.

Nós originalmente desenvolvemos a PAF (Kolenberg & Tsai, 1991) para explicar porque alguns de nossos clientes que recebiam a TCC padrão demonstravam uma transformação rápida e marcante em suas vidas, muito além daquilo que normalmente era esperado para o tratamento. Cada um destes casos inesquecíveis envolveu a ocorrência natural, e particularmente intensa, de uma relação terapeuta-cliente envolvente e emocional. Nós procuramos explicar tais relações terapeuta-cliente por meio de uma análise behaviorista radical (Skinner, 1945, 1953, 1957, 1974) do processo psicoterapêutico, realçada na história de cada caso.

Certamente, a noção de que a relação terapeuta-cliente ocupa um papel central na produção de mudança é inerente à literatura de psicoterapia e possui um suporte empírico considerável (veja o Capítulo 2). Nossa intenção ao utilizar os conceitos behavioristas radicais no entendimento deste fenômeno era prover uma nova perspectiva sobre a forma como a relação terapeuta-cliente contribui para os ganhos terapêuticos. Nós utilizamos uma abordagem “de cima para baixo”, que começava pelas observações clínicas de intervenções terapêuticas e seus efeitos, para então utilizar os conceitos comportamentais na explicação de tais efeitos. Nós também utilizamos uma abordagem “de baixo para cima”, aplicando conceitos comportamentais juntamente com contribuições experimentais e teóricas para informar, modelar e refinar as intervenções terapêuticas. A PAF que é praticada hoje reflete mais de duas décadas deste processo interativo.

Uma vantagem central da abordagem comportamental incorporada à PAF é que ela realça mecanismos hipotéticos de mudança que, por sua vez, podem ser utilizados em manuais de tratamento específicos que são facilmente ensináveis. Os conceitos e definições comportamentais permitem que os terapeutas disponham de um amplo leque de mecanismos terapêuticos significativos, tais como ‘coragem’, ‘amor terapêutico’, e ‘criação de um espaço sagrado’ (veja Capítulo 4), o que em geral não é feito nas terapias cognitivo-comportamentais. Trazer esta coragem e este amor pra dentro da relação com os clientes é um processo difícil que faz com que os terapeutas rumem em direção às pontes de suas zonas de conforto – o que freqüentemente evoca esquiva emocional. Nós também escolhemos o behaviorismo para facilitar com que os terapeutas aceitassem riscos de forma responsável e ética em benefício de seus clientes.

Autotes: Robert J. Kohlenberg, Mavis Tsai e Jonathan W. Kanter
Fonte: Tsai, M; Kohlenberg, R. J.; Jonathan, W. K.; Kohlenberg, B.; Follette, W. & Callaghan, G. M. A Guide to Functional Analytic Psychoterapy. Awareness, courage, love and behaviorism. New York: Springer.

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Autismo – um breve histórico.

“… Imagine chegar em um país onde você não entende a língua e não conhece os costumes – e ninguém entende o que você quer ou precisa. Você, na tentativa de se organizar e entender esse ambiente, provavelmente apresentará comportamentos que os nativos acharão estranhos…” (citação retirada do Manual de Treinamento ABA – Help us learn – Ajude-nos a aprender.)

Esta frase pode ser utilizada para compreender a maneira de uma criança portadora do Transtorno de Espectro Autista pensar, sentir e se comportar. Muitos dizem realmente que o autista constrói para sí uma realidade paralela, alheia a nossa, e por viver “lá dentro” não consegue se comunicar com os outros que vivem no mundo “real”. Será verdade? Vamos resumir aqui um pouco da história do diagnóstico de autismo a partir do texto Abordagem Comportamental do Autismo, de autoria de Alexandre Costa e Silva, diretor de relações públicas da Associação Brasileira de Autismo.

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Breve Histórico.

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A palavra “autismo” deriva do grego “autos”, que significa “voltar-se para sí mesmo”. A primeira pessoa a utilizá-la foi o psiquiatra austríaco Eugen Bleuler para se referir a um dos critérios adotados em sua época para a realização de um diagnóstico de Esquizofrenia. Estes critérios, os quais ficaram conhecidos como “os quatro ‘A’s de Bleuler, são: alucinações, afeto desorganizado, incongruência e autismo. A palavra referia-se a tendência do esquizofrênico de “ensimesmar-se”, tornando-se alheio ao mundo social – fechando-se em seu mundo, como até hoje se acredita sobre o comportamento autista.

Em 1943 o psicólogo norte americano Leo Kanner estudou com mais atenção 11 pacientes com diagnóstico de esquizofrenia. Observou neles, o autismo como característica mais marcante; neste momento, teve origem a expressão “Distúrbio Autístico do Contato Afetivo” para se referir a estas crianças. O psicólogo chegou a dizer que as crianças autistas já nasciam assim, dado o fato de que o aparecimento da síndrome era muito precoce. A medida em que foi tendo contato com os pais destas crianças ele foi mudando de opinião. Começou a observar que os pais destas crianças estabeleciam um contato afetivo muito frio com elas, desenvolvendo então o termo “mãe geladeira” para referir-se as mães de autistas, que com seu jeito frio e distante de se relacionar com os filhos promoveu neles uma hostilidade inconsciente a qual seria direcionada para situações de demanda social.

As hipóteses de Kanner tiveram forte influência no referencial psicanalítico da síndrome que  pressupunha uma causa emocional ou psicológica para o fenômeno, a qual teve como seus principais precursores os psicanalistas Bruno Bettelheim e Francis Tustin.

Bettelheim, em sua terapêutica, incitava as crianças a baterem, xingarem e morderem em uma estátua que, pelo menos para ele, simbolizava a mãe delas. Tustin, por outro lado, acreditava em uma fase autística do desenvolvimento normal, na qual a criança ainda não tinha aprendido comportamentos sociais e era chamada por ela de fase do afeto materno,  funcionando como uma ponte entre este estado e a vida social. Se a mãe fosse fria e suprimisse este afeto, a criança não conseguiria atravessar esta ponte e entrar na vida social normal, ficando presa na fase autística do desenvolvimento. Em 1960, no entanto, a psicanalista publica um artigo no qual desfaz a idéia da fase autística do desenvolvimento.

Naquela época a busca pelo tratamento psicanalítico era muito intensa. Muitas vezes as crianças passavam por sessões diárias, inclusive no domingo. O preço pago era muito alto. Muitas famílias vendiam seus bens na esperança de que aquele método as ajudasse a corrigir o erro que haviam cometido na criação de seus filhos.

Com o advento da década do cérebro, no entanto, estas idéias começaram a ser deixadas de lado – além de não estarem satisfazendo as expectativas dos pais. A partir de 1980 foram surgindo novas tecnologias de estudo, as quais permitiam investigação mais minuciosa do funcionamento do cérebro da pessoa com exames como tomografia por emissão de pósitrons ou ressonância magnética. Doenças que anteriormente eram estudadas apenas a partir de uma perspectiva psicodinâmica passaram a ser estudadas de maneiras mais cuidadosas, deixando de lado o cogito cartesiano.

Já na década de 60 o psicólogo Ivar Lovaas e seus métodos analítico comportamentais começaram a ganhar espaço no tratamento da síndrome. Seus resultados apresentavam-se de maneira mais efetiva do que as tradicionais terapias psicodinâmicas. E já naquela época as psicologias comportamentais sofriam forte preconceito por parte dos psicólogos de outras abordagens.  Durante as décadas de 60 e 70 os psicólogos comportamentais eram consultados quase que apenas depois que todas as outras possibilidades haviam se esgotado e o comportamento do autista tornava-se insuportável para os pais e muito danoso para a criança.

E como o autismo é visto hoje?

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É característico do autista apresentar alguns déficits e excessos comportamentais em diversas áreas, conforme melhor explicado adiante. O grau de comprometimento destes déficits podem variar de uma criança para outra e na mesma criança ao longo do tempo. Por este motivo, a expressão Transtorno do Espectro Autista  tem sido mais utilizada em detrimento da palavra Autista.

Manuais diagnósticos como o DSM – IV TR e o CID – 10 caracterizam o autismo como um transtorno pervasivo do desenvolvimento no qual existe comprometimento severo em áreas como: diminuição do contato ocular; dificuldade de mostrar, pegar ou usar objetos; padrões repetitivos e esteriotipados de comportamento; agitação ou torção das mãos ou dedos, movimentos corporais complexos; atraso ou ausência total da fala. A National Society for autistic children o encara como um distúrbio do desenvolvimento que se manifesta de forma incapacitante por toda a vida, aparecendo tipicamente nos três primeiros anos de vida. Define como critérios para diagnóstico do autismo o precoce comprometimento na esfera social e de comunicação.

Este Transtorno Invasivo do Desenvolvimento acomete apenas cinco entre cada dez mil nascidos, ocorre em famílias de todas as configurações raciais, étnicas ou sociais. Gauderer (1993) afirma que maioria das crianças com diagnóstico do Transtorno de Espectro Autista tem fisionomia normal, e sua expressão séria pode passar a idéia, geralmente errada, de inteligência extremada. Apesar da estrutura facial normal, no entanto, estão quase sempre ausentes a expressividade das emoções e receptividade presentes na criança com desenvolvimento típico.

Nem sempre o autismo está associado a deficiência mental. Às vezes ele ocorre em crianças com inteligência classificada como normal. O chamado “déficit intelectual” é mais intenso nas habilidades verbais e menos evidente em habilidades viso-espaciais. É muito comum, no entanto, crianças com este diagnóstico apresentarem desempenho além do normal em tarefas que exigem apenas atividades mecânicas ou memorização, ao contrário das tarefas nas quais é exigido  algum tipo de abstração, conceituação, sequenciação ou sentido.

Incidência

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Existem várias definições e critérios diagnósticos diferentes do que vem a ser o autismo. Em  decorrência disto, é difícil traçar um nível de incidência confiável, pois conforme variam as definições e critérios diagnósticos, variam também a quantidade de pessoas diagnosticadas. Os índices mais aceitos e divulgados, no entanto, trazem uma média de 5 a 15 casos em cada 10 000 pessoas. Pesquisas epidemiológicas utilizando o DSM – III-R identificam o dobro deste numero. Quando os criterios medicos são deixados de lado em detrimento dos educacionais, a média aumenta para 21 casos em cada 10 000 pessoas. Quando a síndrome é mais rigorosamente classificada e diagnosticada, entretanto, encontra-se uma prevalência de 2 casos para cada 10 000 pessoas.

Independentemente de qual critério diagnostico seja adotado, sabe-se que pessoas do sexo masculino são em geral mais atingidas. De acordo com o DSM – IV, ele ocorre três ou quatro vezes mais em meninos do que em meninas. Estas, no entanto, tendem a apresentar limitacões mais severas.

Algumas hipóteses etiológicas

Embora diversos tipos de alterações neurológicas e/ou genéticas tenham sido descritas como prováveis etiologias do autismo, não há nada comprovado ainda.  O transtorno pode estar diretamente associado a problemas cromossômicos, genéticos, metabólicos, e até mesmo doenças transmitidas ou adquiridas durante a gestação, durante e após o parto. A dificuldade em elaborar um diagnóstico de autismo é grande, quando se pensa que diversas síndromes possuem sintomatologia semelhante.
Uma quantidade de 75 a 80% das crianças com diagnóstico de Transtorno do Espectro Autista apresenta algum tipo de retardo mental, o qual pode estar associado a inúmeros fatores biológicos.

Alguns autores, como Gauderer  afirmam que algumas alterações encefálicas em fases críticas do desenvolvimento embrionário podem dar origem a algum tipo de transtorno que se enquadre no diagnóstico de transtorno do espectro autista, mas os exames clínicos que vem sendo realizados não demonstram correlação significativo entre estas alterações e o transtorno.

Este texto trata-se de um resumo discutido do artigo Abordagem Comportamental do Autismo, de autoria de Alexandre Costa e Silva.

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